sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

é verão no meu natal

a enchente levou o meu amor incondicional. o aquecimento global das minhas funções vitais trouxe o moribundo cheiro daquela que não se pronuncia o nome. perdi tudo. minhas posses foram carregadas pela água de bunda – a mágica união de dejetos, lixos e chuva ácida.

mamãe, aquela maldita, anda roubando fraldas geriátricas. meteu-se com um homem sem finura e pratica furtos de donativos. pobres velhinhos, mamãe só pensa em seu próprio orifício danificado pelos anos de mau uso em casas de massagens. mamãe é da labuta.

minha casa agora é flutuante; moro num pedaço de telhado que mana com as águas. apenas eu e minha vaca, eu e minha lactose. ainda bem que não faço uso de fraldas geriátricas, um problema a menos para considerar.

papai é desconhecido, sou filha de muitos e de ninguém; sou mesmo é filha do ofício. fui alfabetizada por uma dama da noite, uma cortesã luxuosa que trabalhava com aquela desgraçada. exímia libertina, me explicou tudo sobre biologia, português e elegância. uma fidalga que partira da fina flor da sociedade e fora viver na marginalidade.

hoje sou eu e minha bovina. nunca dei certo com os homens: os que não se deitaram com aquela encardida que me deu à luz fugiram com medo. as mulheres também não me servem com suas alterações cíclicas de humor e necessidade patológica de serem compreendidas.

amo mesmo é aquela vaca.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

pedalinhos, molotovs e três buchas impensantes

furiosa, a população civil do rio de janeiro uniu-se em prol do aniquilamento do gigante aparato natalino da lagoa, causador de tráfegos noturnos e esbanjador de eletricidade capaz de iluminar diversas vizinhanças relegadas à escuridão.

um grupo de adultos jovens, sem ficha criminal, ligou-se em plano sórdido para dar fim ao monumento pouco sofisticado que inseriu-se nas vidas ordinárias de cidadãos de bem. para realizar tal feito, produziram coquetéis molotovs caseiros, todos ornamentados com símbolos graciosos de natal e em seguida seqüestraram três pedalinhos de cisne, sendo um deles cor-de-rosa, para a mocinha que participava do ataque terrorista.

eram três militantes da elite carioca, daquele tipo que jamais sofreu influência de um governo ditador, mas que guardava uma nostalgia vulgar daquele período histórico e agia com revolta infundamentada, realizando mini-passeatas nas universidades em prol de um mundo melhor (utilizando-se da intolerância e fazendo do mundo um lugar pior).

e numa noite abafada de dezembro, a rapeize praticou o ato da destruição. lentamente – armados até os dentes e montados em seus inocentes e pueris cisnes pedaláveis – rumaram em direção ao emblema carioca do amor natalino. com catapultas fabricadas em suas coberturas de luxo, arremessaram as bombas, ora enfeitadas por um papai noel, ora por um singelo anjo ou ainda por renas do nariz vermelho. a árvore ficou em chamas; diversas explosões foram ouvidas pelas cercanias.

a polícia solidarizou-se com a ruína do baluarte da cultura cristã e rapidamente adentrou em pedalinhos estacionados, que dormiam na madrugada quente, esperando por um exaustivo dia de lazer. executaram uma perseguição implacável, porém morosa, dada a condição do meio de transporte escolhido por meliantes e patrulha.

a árvore era consumida pelo fogo, enquanto os pseudo-benfeitores direcionavam-se para a fuga. os defensores da ordem pública pedalavam e narravam em seu alto-falantes: "– parem os patos gigantes agora! considerem-se presos!". a escapatória ocorreria através do canal do jardim de alá, dirigindo-se para o oceano, a fim de descansar no arquipélago das cagarras, notório pela grande quantidade de excrementos das aves marinhas que habitam ou sobrevoam a localidade.

encalçaram vorazmente os robin hoods tupiniquins, porém a conclusão foi trágica: ao serem atacados por ratos, cobras e lagartos no desembarque, os pulhas melindrosos arremessaram-se ao mar em plena noite, já que seus veículos sem âncora haviam se perdido na imensidão azul-marinho. os dois rapazes e a jovem dama do cisne rosa faleceram antes do socorro da polícia, pois tomaram uma chicoteada do rabo de uma baleia transeunte, que nadava livremente pela região.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

meu pé de toranja lima

era um pomar de toranjas, mirtilos e cajás-manga. a dona era uma moça chamada amora pêra, que degustava uma banana-nanica. suas frutas eram maltrapilhas e abandonadas.

houve um motim: limas-da-pérsia e abacaxis ameaçavam sua pele com acidez; fiapos de manga se alojavam entre seus dentes; goiabas prendiam seu intestino ao mesmo tempo em que mamões o liberavam.

fez-se um belo suco gástrico apodrecido, pronto para consumir; ela agitou antes de beber. amora pêra morreu por desamor às frutas.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

procura-se, vivo ou morto

juju era um bulldog francês asmático, tuberculoso e adorável. encontrava-se em estado terminal devido a um sarcoma das partes moles e, desde julho de dois mil e oito, fora desenganado pelos melhores veterinários norte-fluminenses. a partir dessa data, passara a entoar o fúnebre e inebriante canto da morte – suplícios melódicos, doces, nebulosos e prolongados (oooooooh... oooooooh...), seguidos por rompantes de gritos desesperados, que se assemelhavam a tosses secas e avolumadas (Uaaah! Uaaah! Uaaah!).

fugiu em doze de setembro de dois mil e oito, deixando seu proprietário, o terceiro mamilo, com o coração transbordando em mágoas. tamanha era sua fidelidade ao dono, que desapareceu neste vasto mundo de deus para que esse não o acompanhasse em seu letárgico processo de empacotamento.

juju era um canino de boa índole, honesto e charmoso. não havia quem resistisse às suas pernas dobradas como as de uma rã quando em estado de repouso, ao mesmo tempo em que emanava um cativante olhar de 'coisa-alguma-para-lugar-nenhum'.

tinha 15 anos, era vegetariano, canceriano, imaturo, muito ligado à família e do tipo 'cachorro-de-uma-cadela-só'. fugira com a virgindade ainda intacta: nunca encontrara a fêmea com quem iria compartilhar seus sonhos e desejos secretos. era um romântico incurável; deveras lírico, esse pequeno notável. muitos o tiveram por homossexual, mas era apenas um incompreendido, já que não tinha o ímpeto de correr atrás das cachorras de boate no cio.

o terceiro mamilo não é mais o mesmo sem o cãozito moribundo. ele se foi, mas o seu pesar ainda ecoa na tetinha, como o coçar de um membro-fantasma. clama aos céus para que deus lhe conceda a chance de ter juju ao seu lado, urrando seus sons obscuros e primários, por uma última vez.

a equipe da mama sobressalente oferece dez merréis, cinco cruzados novos, três feijões mágicos e ainda paga com o corpo, para tê-lo em seus braços novamente.

ps: o terceiro mamilo é uma loira exuberante, geminiana, sapeca, seios estupendos (todos os três são belíssimos), faz casais e grupos. talento especial: manobra de duplo flip carpado seguido por mortal triplo e felação cravada. favor entrar em contato pelo telefone VUCO-VUCO e procurar por shuppada pinto. obrigada desde já, equipe mamilar.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

sobre os primatas e a labuta

"descartes afirma que os macacos poderiam falar se quisessem, mas que resolveram guardar silêncio para não serem obrigados a trabalhar." (jorge luis borges)

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

a verdade por detrás das tempestades

rodolfo, um gigante ruivo e sertanejo, por vezes resolve ordenhar seu rebanho de nuvens, despejando perdigotos do translúcido leite celeste sobre os homens. em outros momentos apenas chora sua solidão de pessoa grande, vertendo lágrimas acéfalas na terra.

terça-feira, 29 de julho de 2008

homenagem mamilosa ao trocadilho maroto

o gato tico (composição de origem desconhecida)

tico-tico é um gato
que a maria quer bem
não dá, não troca, não vende
nem empresta pra ninguém
o tico tem um defeito
que não dá pra consertar
o defeito do tico
é danado pra miar

tico mia na sala, tico mia no chão
tico mia na cozinha, tico mia no fogão
tico mia no tapete, tico mia no sofá
tico mia na quarto, toda hora sem parar

tico mia na colo, tico mia na mão
tico mia sentado, em frente à televisão
tico mia no almoço, tico mia no jantar
e a noite inteira tico mia sem parar

segunda-feira, 28 de julho de 2008

os deuses devem estar loucos

o mundo está bizarramente modificado. pessoas grandes trajam vultuosas roupas infantis e se utilizam do talco 'tenys pé' da baruel na versão tutti frutti, passando o dia em atividade e mantendo o cheiro de chiclete misturado ao odor fétido de seus pés sem mocidade.

nenês maduros dominam o mercado de trabalho, usam reduzidas vestimentas próprias da maioridade, tais como ternos e tailleurs, e ditam regras aos grandalhões criançolas dotados de maus cheiros típicos da ancianidade.

homens e mulheres adultos pelejam por doces em forma de bengala listrados em vermelho e branco e bebês que ainda não controlam seus enfincteres arriscam milhões na bolsa e acabam-se no álcool e nos cigarros.

crianças recém-nascidas levam indivíduos da meia-idade para passear na praia e estes acabam por mostrar suas genitálias com despudor ingênuo, jogando areia uns nos outros, enquanto tolamente padecem de eventuais manifestações orgânicas de excitamento sexual em público.

resumidas criaturas famintas em trajes de gala encontram alento em tetas lactantes de damas imaturas, que apenas são coniventes com tal situação quando os pequenos fingem-se de bonecos em brincadeiras de 'casinha'.

é o fim do mundo que conhecemos.

terça-feira, 1 de julho de 2008

vocábulos bufões em destaque

palavra do dia: cogitabundo.

sinônimo dia: meditabundo.

derivação sonora da palavra e do sinônimo do dia: nauseabundo.

cogitabundo/meditabundo do dia: primata compenetrado ao lado.

(trocadilhos infames para com as palavras em questão ficarão a critério do consumidor)

sábado, 28 de junho de 2008

ele está no meio de nós

fantasias notívagas em sono profundo de um final de semana qualquer:

pessoas no meu entorno eram perseguidas pelo diabo. ele implantava imagens dos piores medos nas mentes alheias e as tornava reais. estava com um grupo de amigos e familiares e tentávamos encontrar maneiras de fugir do capiroto e de suas artimanhas.

até que conheci a kate moss, que julguei ser uma enviada do canhoto.

ficamos amigas e ela resolveu tornar conhecida a identidade humana de lúcifer. tratava-se de um empresário brasileiro milionário. sem espanto, pensei: 'depois de al pacino e robert de niro terem vivido o lá-de-baixo nas telas, agora é a vez dele'.

sugeri que kate moss abandonasse a vida ingrata de emissária do demo e foi então que revelou o segredo do coisa-ruim. disse que não havia o que temer, pois ele apenas fazia jogos ilusórios, nenhuma das imagens que injetava nas consciências de outrens era verdadeira.

o tinhoso, então, aproximou-se. vimos o filho depressivo de kate pegando uma arma e atirando contra a própria cabeça na cozinha da casa. com sua peculiar elegância e atitude, ela olhou para o pé-de-cabra com um desprezo que só divas mal-humoradas são capazes de reproduzir e o cramulhano partiu. logo seu filho estava ao seu lado na cama, feliz e sorridente.

aconselhada por uma modelo junkie e problemática, compartilhei com a população onírica o mistério do inferno e o belzebu opulento foi à bancarrota quimérica.

fim do sonho.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

o regresso do mamilo pródigo

acordara e saíra de seu sarcófago mofado como se trezentos anos não houvesse passado; era um mamilo ex-defunto, que ignorava o milagre da ressurreição. morrera e não notara. agora renascia das cinzas sem perceber que atravessara os mistérios mais inomináveis. continha em si todas as respostas aos enigmas milenares da raça humana (e quiça da raça mamilar), mas seguia desconhecendo a grandiosidade do que habitava sua pacata mama por debaixo de sua simploriedade.

em seu retiro espiritual, o mamilo não encontrou a paz, apenas a escuridão e a interrupção de sua vida excêntrica. passara dessa para uma melhor após consumir especiarias indianas deveras condimentadas e lactar por três dias seguidos uma espécie de leite de côco apimentado ao curry.

como todos aqueles que têm sua existência findada, o mamilinho não pôde compreender a magnitude do que lhe ocorria. apenas desfaleceu como quem entra em sono profundo. centenas de anos depois acordou em sua diminuta tumba oriental e pôs-se a caminhar como se a morte não lhe tivesse afagado o bico.

assim, percorrendo cultos secretos sem a menor consciência, o terceiro mamilo retorna ao convívio social, espalhando sua peculiar tolice para os quatro cantos do mundo.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

glândulas mamárias fatigadas

em meio à uma série de eventos traumáticos e desastrosos, o terceiro mamilo entra oficialmente em férias impostas por uma perita equipe médica especializada em seios.

um grupamento de sintomas de estresse pós-traumático se apresentou após a perda irreparável de sua aréola numa derrapagem no asfalto ocorrida em meio a uma tormenta da natureza. a mama sobressalente ficou deveras esfolada e tornou-se necessária uma intervenção cirúrgica estética, que infelizmente foi mal sucedida.

de posse de nada mais que uma depressão grave e um bico do seio solitário e lamuriento pela ausência do seu contorno, a extra-teta pôs-se a vagar a esmo, na busca por um sentido para sua existência vazia.

não bastasse sua tristeza transbordante, passou a entornar um líquido esbranquiçado por seu ínfimo e pouco desenvolvido orifício. o diagnóstico foi de 'lactação fora de época', deixando o terceiro mamilo com o vergonhoso status de 'tetinha que chora lágrimas de leite'.

tendo em vista esta recente tragédia na trajetória deste tolo herói assimétrico, o mamilo encontra-se em retiro espiritual na índia na companhia de criaturas descoladas e que também almejam a compreensão da complexa trama cosmogônica.

não há data prevista para seu retorno, já que a atemporalidade é um dos preceitos mamilosos prediletos. tudo acontece em seu tempo próprio e aos mamilos também é reservado o direito da maturação que se desenrola através do sucessivo passar das horas, dos dias, das semanas, dos meses e dos anos, sem trocadilhos jocosos.

com seu bico mamilar que mais parece uma verruga mal-formada, a mama excedente e charmosa acena aquele 'alô' para o pessoal.

abrasao aê. fik com cristo.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

devaneios mamilares noturnos

sonho do terceiromamilo no fim de semana:

dois homens vestidos de gnomos natalinos estão de frente um para o outro. encontram-se num enorme salão, com pilastras e pessoas ao longe. estão na parte mais escura do recinto. um deles tem uma arma apontada para o outro. a vítima é um amigo meu, tem mais ou menos um metro e oitenta e cinco centímetros de altura e está encostado num pilar. o agressor é um homem em forma de ovo, tem uns setenta centímetros de altura, seu rosto fica na parte mais pontuda do ovo, tem o cabelo castanho que mais parece uma peruca que veio grudada no chapéu. é uma figura bastante pitoresca, num formato não-humano, ameaçando meu amigo sem razão aparente.

surjo com uma arma e a aponto para o duende-oval. só o vejo de costas, pelo ângulo em que meu eu-onírico está posicionado. digo: "largue essa arma agora senão estouro seus miolos!". ele nem se mexe. me aproximo mais um pouco, mas não muito, pois sei que em filmes policiais não se pode chegar tão perto do meliante, para que este não faça o bruce lee e roube sua arma. falei mais uma vez para que largasse a arma. ele finalmente o fez e eu peguei a dita. não fiz mais nada em relação à criatura em questão, pois ficara evidente que o pequeno oviforme era apenas um ser esquisito e inofensivo sem seu revólver.

corta a cena.

eu apareço na parte clara do salão, onde estão as pessoas. tem uma mesa com comida, parece uma festa ou uma ceia. eu converso com pessoas: "pois é, um gnomo em forma de ovo estava tentando matar o guilherme, que também estava vestido de gnomo, porém, este último tem um metro e oitenta e cinco centímetros de altura e estava apenas trabalhando no natal pra descolar alguns trocados". todos riem.

fim do delírio onírico natalino.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

sentimental - carlos drummond de andrade

ponho-me a escrever teu nome
com letras de macarrão.
no prato, a sopa esfria, cheia de escamas,
e debruçados na mesa todos contemplam
este romântico trabalho.

desgraçadamente falta uma letra;
uma letra somente
para acabar teu nome!

- está sonhando? olha que a sopa esfria!
eu estava sonhando...
e há em todas as consciências um cartaz amarelo:
“neste país é proibido sonhar”.

terça-feira, 13 de maio de 2008

lamúrias de outono

queria dizer alguma coisa, mas ninguém ouve. noto que a calosidade em minhas cordas vocais tornou-se demasiado severa e minha voz abandonou-me. passo horas movimentando tolamente os lábios e gesticulando. as pessoas olham-me intrigadas, mas nem um único grunhido é emitido.

por ora gostaria de ouvir palavras ternas e macias, mas a cera acumulou-se por tantos anos em meus ouvidos que entupiu meu aparelho auditivo. pessoas conversam e movimentam-se passionalmente e as observo com afinco, mas não ouço nada.

queria ver o que reside por trás das linhas imaginárias geográficas, mas não enxergo um palmo à minha frente. um pesco-tapa jocoso transformou-se em grave acidente, atingindo meus nervos ópticos e causando cegueira irreversível. o mundo tornou-se negro e tátil. busco pela luz, mas a escuridão engoliu tudo à minha volta.

seria gratificante ter uma idéia inteligente ou pensamentos bonitos, mas meus neurônios não fazem mais sinapses. tento executar atividades mentais diversas, mas meu cérebro morreu. em lapsos de lembranças de uma vida pré-acéfala, penso em como era simpático o meu inglês, porém agora resta-me apenas um português desdentado e analfabeto.

minha piscina está cheia de ratos e as idéias não correspondem aos fatos. cega, surda, muda e burra, sobrou-me nada mais que devaneios e dois sentidos pouco apurados. para completar, encontro-me gripada, comprometendo ainda mais minhas faculdades orgânicas parcas e débeis.

vagueio por este vasto mundo de deus tentando evitar a tetraplegia e a barriga d'água, para que não perca a capacidade de locomoção e não fique com o abdome protuberante, compondo um pacote verdadeiramente campeão.

pas. tudo oque eu pesso é pas.


quinta-feira, 8 de maio de 2008

neovadiol, o novo produto anti-idade da vichy


neovadiol é o polêmico anti-rugas veementemente desaprovado pelo sexocristão.com por fazer apologia clara à prática da fornicação. porém, o oterceiromamilo, em seu exercício de tolerância às diferenças e assimetrias da vida, considera o cuidado com sulcos dérmicos uma atividade edificante para os que intencionam envelhecer com dignidade.

ao que tudo indica, neovadiol seria mais que um creme de embelezamento. dizem alguns anônimos revoltados que o dito produto estaria envolvido num movimento contra os bons costumes e a moral, numa espécie de tentativa de deixar vadias aposentadas e velhas de guerra com a cútis lisa, tornando-as mais propensas a atitudes libertinas na 'melhor idade'.

“neovadiol: para você que se cansou de ser uma vadia ultrapassada. mande suas rugas às favas e seja uma vadia contemporânea você também.”

quarta-feira, 30 de abril de 2008

dura de matar 3 - a pequena miraculosa

em vinte e oito de abril de dois mil e oito, foi anunciada a misteriosa 'ressureição' da jovem semi-ruiva que havia sucumbido indignamente semanas antes, em decorrência do seu amor sem limites pela vida selvagem.

ná pô, que está com a saúde estável e dotada de plena consciência, conta que após acariciar alguns de seus vinte e quatro bichanos desprovidos de pêlos, resolveu recostar-se em seu trailer para descansar, pensando em como seria pitoresco lançar-se aos céus fazendo uso de nada mais que balões de gás hélio, para que além de voar, pudesse sugar o conteúdo de algumas bexigas e cantar com a voz realmente fina em alturas inimagináveis.

entregou-se ao agradável sono do meio da tarde para, então, despertar dentro de um caixote sufocante de madeira. Seu desespero, no entanto, não durou muito. Logo lembrou-se de que em um de seus bolsos carregava um pequeno recipiente com diversos espécimes de cupins adestrados, pois que estes insetos haviam tornado-se objeto de sua paixão excêntrica nas últimas semanas. libertou-os e imediatamente trataram de comer toda a madeira em menos quarenta e oito horas, num exímio trabalho em equipe.

de volta à vida, ná pô vagou a esmo coberta de terra e em trajes maltrapilhos por dias, balbuciando palavras desconexas e repetindo para si mesma: 'eu quero melão, eu prefiro melão', já que mamão nunca havia sido seu forte.

retornou ao lar, para aplacar a fúria de sua prole descontrolada, que lutava como se não houvesse amanhã pelo legado de valor inestimável que deixara, já que a mistura das duas fatias de queijo minas apodrecidas com urina de morcego e asas de libélula, havia criado uma iguaria saborosa jamais vista antes no mundo dos laticínios.

apesar do transtorno familiar, ná pô fez fortuna e hoje usufrui de uma vida abastada. Dizem à boca miúda que ela anda por aí proferindo: 'jamais morrerei de zoonose novamente!".

bem vinda de volta à vida, minha cara. são estes os votos de jugón e família.


quarta-feira, 16 de abril de 2008

a lascívia segundo jesus cristo

“estudo completo sobre fornicação: o dicionário silveira bueno define como sendo praticar ato sexual. o dicionário vine define assim: intercurso sexual ilícito.

fornicação, quem comete? todo aquele que pratica relação sexual fora do casamento. ou seja: namorados e noivos não podem cometer o ato sexual pois senão serão fornicadores.

o que a bíblia fala a respeito dos fornicadores? ap 21:8 - 'mas, quanto aos tímidos, e aos incrédulos, e aos abomináveis, e aos homicidas, e aos fornicadores, e aos feiticeiros, e aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua parte será no lago que arde com fogo e enxofre; o que é a segunda morte'.

casais que moram juntos sem estarem oficialmente casados, também estão em fornicação. se a pessoa morre em fornicação ela vai para o inferno. se jesus voltar, o fornicador não é arrebatado”.

o sexocristao.com sempre faz com que oterceiromamilo torne-se reflexivo. nós, da equipe da extra-teta, admiramos o trabalho de pesquisa dos autores dos artigos, constantemente fundamentados no livro sagrado e em dicionários de procedência obscura.

temos um distindo apreço por citações bíblicas plenas de sentido, tais como a supramencionada, em que dizem que um indivíduo tímido ou incrédulo arderá nas chamas mal-cheirosas do inferno junto aos que cometeram crimes hediondos. até porque, convenhamos, está tudo no mesmo patamar de infâmia.

cremos que aquele que morre fornicando deveria ter uma penitência pós-vida bastante severa, assim como o tímido que morre enquanto gagueja e toma coloração avermelhada apresentando uma palestra ou como um feiticeiro que morre praticando ciências ocultas munido de galinhas, sapos, tufos de cabelos de virgens e dentes-de-leite de crianças-prodígio.

oterceiromamilo aprova e recomenda a leitura do sexocristao, para que não ocorram equívocos na prática de atos libidinosos. esperamos, desta forma, que todos os atos sensuais estejam de acordo com as leis celestiais. só jesus salva.

fica aí a dica: http://www.sexocristao.com/


terça-feira, 15 de abril de 2008

o dia em que a pequena ruiva sucumbiu

aqui jaz ana paula monte, uma mulher de atitudes complexas e vida fácil. desde sua mais inocente infância amava os animais e dedicava horas dos seus dias a acariciar tetas asquerosas de mamíferos domésticos, além de prender mariposas em latas de lixo durante a noite para assustar seus familiares na manhã, quando desavisadamente jogavam o primeiro papel higiênico usado do dia no tal recipiente.

ironicamente hoje, aos cinqüenta e cinco anos de idade, a pobre mulher veio a óbito em decorrência de uma zoonose adquirida de forma não comprovada. exames atestam que a procedência adveio de algum animal silvestre, dada sua inclinação por aventurar-se na natureza selvagem e interagir com a fauna e flora locais.

assim, com esta morte inesperada e sem honra, ná pô, como era conhecida em seu círculo íntimo, deixa para sua vasta prole nada mais que um trailer escassamente mobiliado, duas dúzias de gatos sem pêlos, seis periquitos, oito libélulas, um morcego, uma coleção de bonecas russas de camelô e duas fatias de queijo minas.

espero que em seu descanso etéreo encontre a paz que jamais encontrou em vida.

repouse com o sossego dos céus.

com amor, jugón.


sexta-feira, 4 de abril de 2008

a mística dos galináceos

o mistério da criação por thomas green morton, o 'homem do rá':

"vou pegar um ovo fecundado, colocar a gema e a clara num prato e, em trinta minutos de energização, vou criar um pintinho".


terça-feira, 1 de abril de 2008

mumu da mangueira


nego véio quando morre (os originais do samba)

quando eu morrer quero ir de fralda de camisa
defunto pobre de luxo não precisa

cinquenta velhas desdentadas e carecas
hão de ir à frente tocando rabeca

e um velho bem barrigudo
ir lá na frente tocando no canudo

quatro velhas que forem de balão
irão segurando nas argolas do caixão


domingo, 23 de março de 2008

o livro dos seres imaginários (borges)

o catóblepa, um búfalo negro com uma cabeça de porco que cai até o chão, discorrendo sobre si mesmo:

"'corpulento, melancólico, fosco, não faço outra coisa senão sentir sob o ventre o calor do lodo. meu crânio é tão pesado que não consigo levantá-lo. enrolo-o em torno de mim, lentamente; e, com as mandíbulas entreabertas, arranco com a língua as ervas venenosas umedecidas por meu hálito. uma vez devorei minhas próprias patas sem perceber.'"

eis uma criatura digna.

sábado, 22 de março de 2008

pensamentos de um sábado de aleluia

tenho nada mais que um botão velho no bolso. há tempos que não sei o que é o amor. minha última paixão me trocou, meu vestido mais bonito foi furado por um cigarro e minha família viajou e me deixou à mercê de bandidos picaretas em nova iorque.

restou-me coisa alguma afora a melancolia. e também um criado-mudo, já que contratei um mordomo sem aptidão para fala, que cuida com bastante afinco e elegância do meu apartamento de treze metros quadrados e sem mobília.

não saio de casa há quatro meses, pois os contatos humanos têm me trazido pouco prazer. por vezes me sinto insignificante. penso nos erros do passado e desisto da prática da tolice. atualmente apenas realizo o ócio e a sobriedade.

os amigos me abandonaram. comprei um periquito na semana passada, mas ele morreu de gripe aviária. suas penas arrepiaram-se e por cinco dias tomou a forma arredondada de um repolho, até que entrou em coma e partiu dessa para uma melhor.

minha vida faz tanto sentido quanto uma ovelha lasciva em trajes sensuais sumários, que ouve jazz e come macadâmia.

queria partir para algum lugar remoto, onde não fosse de domínio público que faço uso de perucas para esconder meu crânio pelado e que um dos meus dentes dianteiros é uma prótese.

sempre quis ser aquela que vai embora, mas eu fico. persistentemente eu fico...

quarta-feira, 19 de março de 2008

um feriado romântico

uma feminista militante do clubinho do livro pergunta: "quem teria sido a verdadeira paixão de cristo?"

terça-feira, 18 de março de 2008

quando ninguém estava olhando

uma mulher coça as costas com uma caneta. encontra-se em local público, mas parece não se importar com a presença de terceiros. contorce a face e entorta-se ao máximo de sua elasticidade na tentativa de atingir o ponto crucial, mas o comichão persiste.

anda mais alguns metros na direção de uma parede cor de mostarda com pátina. começa a esfregar seu dorso grosseiramente contra a dita, assemelhando-se a um cão sarnento em desespero. pratica este ato com semblante de alívio. os olhinhos pequenos e tolos lacrimejam em espasmos involuntários, até que o movimento cessa. desliza pela parede e leva seu lombo ao chão.

ali ela fica, alheia ao mundo à sua volta. sabia que havia executado algo excepcional, pois não é todo dia que dá-se fim à pruridos ancestrais. havia silenciado cinco gerações passadas e quiça uma futura.

e todos os dias feitos heróicos são ignorados...


terça-feira, 4 de março de 2008

quando as artérias dramáticas sobrepõem-se às veias cômicas

um dia escuro, daqueles em que nada faz muito sentido. a garganta dói um pouco e de resto, apatia. na caixa de e-mails um spam de uma fancha feminista militante sobre o dia internacional das mulheres. num dia normal acharia graça, mas hoje meus dentes não estão em exposição.

só uma impressão ainda sorumbática de que tudo vai ficar bem. mudanças são boas no fim das contas, fazer escolhas faz parte da vida, yada yada yada. mas agora fico com as incertezas, com o sentido misterioso das coisas que ainda não aconteceram e com o medo de deixar para trás aquilo que de tão passado, já se decompôs e foi devorado por vermes famintos.

e sigo com a coragem dos tolos. há que se possuir uma certa imbecilidade para aceitar riscos. por mais um dia a dinastia do terceiro mamilo reina sobre os homens, pois que a mágica do extraordinário deve prevalecer.

o mundo é mágico, de fato.


quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

o amor nos tempos de cólica

uma mulher cor de bronze adentra uma pocilga mal freqüentada em notório bairro da zona sul carioca. é proprietária dos seios mais naturalmente fartos e protuberantes desde a idade média. começa a dançar sob a influência de uma canção juvenil e tensa, enquanto suas tetas descomunais balançam ao léu. os olhares estão fixados nela, que entre um remelexo e outro leva as mãos às costas, com uma suave expressão de dor, demonstrando que seu fardo é realmente díficil de sustentar. seu dote é de fato espantoso, até os mais descolados miram estupefatos.

numa das mesas, um rapaz de humor indelicado afina seu tom de voz para fazer graça na mesa: “ai, que chão gelado!” ou “o que foi esse vento em meus mamilos? passou um avião?” e ainda “ai, esses japoneses são uns safadinhos...”. todos riem, menos um moço moreno, mirrado, baixinho e portador de um boné com uma logomarca de alguma empresa infame de pequena monta. estava embevecido com a fartura de carne naquele corpo; eis que o pequeno apaixonara-se irremediavelmente.

uma mulher exuberante e um homem parco: era o amor que acontecia sem aviso prévio num destes recintos obscuros e miseráveis.


sábado, 16 de fevereiro de 2008

continuação

idealizado pelos quatro tolos previamente citados

para investigar os crimes, fora contratada uma jovem detetive, que trabalhava como faxineira na empresa televisiva mais bem-sucedida do país, na tentativa de obter melhorias na arrecadação de informações acerca da foragida endemoniada. mas a dita agente de investigação padecia do grave mal da fofoca, perdendo o fio da meada de suas especulações profissionais pelo gozo estúpido do mexerico sem próposito.

enquanto isso, a descontrolada entrevistadora-pelicano continuava a traçar o caminho da destruição do entretenimento sem qualidade, avançando para os atentados contra os apresentadores de programas dominicais. fausto, um famigerado senhor de meia-idade com problemas de sobrepeso e sub-carisma fora sujeitado a sessões de tortura onde, impossibilidado de dormir, era obrigado a assistir ininterruptamente ao seu programa e aos dos concorrentes. em menos de 24 horas foi a óbito por falência generalizada do sistema nervoso.

todas as mortes executadas pela jornalista eram acompanhadas por um pavoroso grito que imitava o som de aves selvagens, uma espécie de: “AAAAAHHH! AAAAAHHH!”. depois balançava os braços como se fosse uma criatura alada e após completar a carnificina, alimentava-se de frutos do mar crus. definitivamente, era uma mulher de hábitos peculiares.

(mais um trecho sem sentido e talvez sem prosseguimento)

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

quando a demência se apossa dos cérebros...

idealizado por alexandre maricato, ana monte, juliana gontijo e marina moreira

marília gabriela emerge das águas do oceano pacífico em uma praia deserta da costa peruana, nua em pêlos, coberta pelo nauseabundo óleo de fígado de leão-marinho e trajando em sua cabeça uma horripilante carcaça de pelicano. fugira a nado de uma penitenciária insular, onde estava condenada à prisão perpétua por assassinatos hediondos em série.

suas vítimas consistiam em jovens atores pouco talentosos e de aparência aprazível. usurpara a sangue frio a existência de quase todo o elenco de 'malhação' e dos participantes da 'casa dos artistas'. seu último alvo havia sido ricardo macchi, a quem obrigara a recitar uma tese de mestrado teológica sobre a identidade cristã na contemporaneidade, com as mãos e pernas atadas numa cadeira velha e vestindo um figurino de cigano do leste europeu, momentos antes de matá-lo a pancadas com seu pontiagudo microfone de entrevistas.


(história a ser continuada ou apenas um trecho sem sentido)

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

minuto de sabedoria

"(...) eis um dos grandes segredos da vida. nos nossos dias, a maioria dos homens morre de uma espécie de senso comum rasteiro; e descobre, quando já é demasiado tarde, que as únicas coisas de que nunca nos arrependemos são das nossas tolices." oscar wilde


ah, o carnaval...

todo carnaval tem seu fim.

mas em nossos corações ficam os perdigotos da perdição, as águas da sarjeta repletas de leptospirose, a pneumonia, os amores fugidios e a nostalgia de uma alegria específica que não nos é concedida em outras épocas do ano.

e o confete continua caindo, grudando nos cílios postiços. e a serpentina continua sendo mal arremessada, atingindo a cabeça de algum desavisado no meio do bloco. e as pessoas seguindo em marcha coletiva rumo a lugar nenhum, apenas pulando e balbuciando palavras aleatórias no lugar das letras das marchinhas.

nem tudo na vida tem fim.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

o urro primal da mulher-maluca

num momento de intensa turbulência hormonal, a mocinha devorou três quindins, seis pacotes de doritos com gorgonzola, um aipo, meia jaca e uma dúzia de corações de galinha. em seguida, com o olhar insaciável de um animalzinho selvagem, ela atacou alguns transeuntes que tiveram a infelicidade de cruzar o seu caminho, despenteando-lhes os cabelos, quebrando e arremessando longe seus pertences e rasgando-lhes as vestimentas com os escassos dentes que restavam em sua gengiva semi-careca.

neste terrível estado de possessão, parou e lançou o olhar insano ao redor. com os cinco sentidos acentuados pela loucura, começou a captar moscas com palitos japoneses. a cada uma arrancava-lhe as asas e deixava-as andando como tolas dentro de um pequeno cercado que construíra com gravetos.

não tolerando mais a mesmice, dançou ao som de músicas tribais asiáticas pelo submundo, espumando como um cão raivoso, até que seu corpo fosse nocauteado pela exaustão suprema. não conseguia parar. mesmo caída ao relento, seus olhos reviravam e seus membros se debatiam em espasmos contra o solo.

finalmente foi capturada pela guarda florestal, sendo depositada numa jaula sob efeito de sedativos pesados, em companhia da capivara que costumava rondar as vizinhanças da lagoa rodrigo de freitas a procura de brigas, drogas e sexo ilegal e de uma lontra mau-caráter que praticava furtos de pequena monta em sinais de trânsito por bairros da zona oeste. e eis o fim da mulher-maluca.


quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

o homem que morava numa caixa de fósforos

estava palestrando para seres inanimados numa manhã chuvosa. era uma garotinha solitária. discorria sobre leguminosas e hortaliças em plena dispensa, onde mantimentos não-perecíveis encontravam-se organizadamente dispostos em prateleiras. durante todo seu discurso manteve os olhos fixados num casal de saleiros 'cisne', daqueles que têm dois tipos distintos, cada qual caracterizando um gênero. a fêmea havia perdido seu chapéu e parecia um ovo cozido de padaria com um galo na cabeça. ao lado estava 'gina', a assustadora e sorridente mulher dos palitos de dente.

ela havia se cansado dos humanos. pareciam não compreender suas palavras, que seguiam padrões de pensamento muito peculiares. passou a dialogar com o reino animal, vegetal e depois mineral, até chegar por fim aos seres de reinos não reconhecidos pela ciência.

eis que, então, a jovem moçoila conheceu nildo, um diminuto homem que morava numa caixa de fósforos. tinha trinta e cinco anos e havia encolhido devido a uma doença degenerativa rara, que começara a se manifestar por volta de seus treze anos. de um metro e sessenta e três, atingira a incrível marca de dois centímetros. seu destino estava quase traçado: morreria de pequeneza, caso não fosse acidentalmente esmagado mundo afora.

se afeiçoaram um pelo outro imediatamente. a solidão de um sussurrara à solidão do outro. o primeiro encontro ocorrera nesta mesma dispensa, pois que a diminuta moradia de nildo localizava-se próxima aos saleiros e a garotinha o avistou enquanto proferia algumas de suas idéias sobre tubérculos. nildo se escondera, temendo ter sua existência findada pela gigantesca criança.

ela garantiu que estava em missão de paz e pediu para que o pequenino se mostrasse em todo seu esplendor. um tanto acanhado, o minúsculo homem deu as caras e logo iniciaram uma conversação que durou cerca de seis horas ininterruptas, onde descobriram que, a despeito da diferença de estatura e idade, compartilhavam de inúmeros interesses. ela achou deveras satisfatório saber que outra pessoa também discordava veementemente da arbitrariedade das linhas imaginárias no atlas e juntos pensaram em criar um novo mapa-mundi, sob a ditadura de suas próprias vontades.

nildo contou sobre sua condição e a menina sentiu um embrulho nas vísceras, percebendo que o tempo de vida do amigo seria tão breve quanto sua ínfima estatura. seu coraçãozinho enchera-se de tristeza, imaginando que teriam pouco mais que dois anos para cultivar a amizade, até que o corpo de nildo desaparecesse.

a habitação do pequeno foi logo transferida para o quarto da garotinha, situando-se no criado-mudo, nas vizinhanças de um rádio-relógio em forma de hambúrguer e de um abajur furta-cor.

a amizade entre eles se consolidava dia após dia e todos a julgavam insana, inclusive seus pais, por parecer desenvolver conversas consigo mesma por horas a fio.

alguns meses depois, nildo foi se tornando tão pequenino e a distância entre eles foi crescendo tanto, que a jovem o convidou para residir em seu umbigo. pensou que esta cavidade corpórea poderia oferecer todo o aconchego e calor humano de que necessitava, já que se tornava cada dia mais frágil.

todas as manhãs ela o chamava e ele, em seu reduzido pijama, se apresentava todo garboso para o café da manhã. de fato nildo era um sujeito elegante, não importava a ocasião. ele se sentava nas redondezas dos pratos e talheres de enormes proporções e se alimentava das migalhas sumárias que ela cuidadosamente preparava, enquanto desenrolavam sobre algum assunto trivial, certamente considerado enfadonho pela maioria dos seres que respiram, mas tido como o elixir da vida por ambos.

até que numa manhã qualquer ela o chamou, mas nildo não veio. repetidas vezes pronunciou seu nome sem nenhum retorno. sabia o significado do silêncio. seu coração gelou. com afinco e melancolia olhou para dentro de seu próprio umbigo. o corpo de seu companheiro dissipara-se para todo o sempre, restando apenas o menor pijama da história da humanidade. e nildo, pequeno em tamanho, porém grande em caráter, tornara-se para a garota aquilo que ela cultivaria até o fim de sua vida como o seu bem mais precioso: a flunfa mais frondosa de que já se teve registro.


sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

divagações sobre a dignidade (3)

agora, com a já prevista morte de seu alter ego sem honra, juliana gontijo volta à normalidade. costumava pensar que não havia nada mais simplório que a normalidade, mas o fato é que épocas excepcionais devem ter fim. não há corpo que tolere a insanidade por muito tempo e não há sistema nervoso que sustente um número de sinapses muito ínfimo ou muito intenso por tempo prolongado.

pensar que não possuía dignidade a fez parecer uma moça menos singela e tola, mas cansou-se de negar sua tolice intrínseca. juliana é verdadeiramente uma tola de deus. às vezes tem apreço por visitar as trevas pelo prazer ingênuo da caminhada aleatória e por precisar aprender que a vida sem limites em algum momento se torna cruel e cínica.

e pelas estradas tortuosas da perdição, juliana encontrou o caminho de luz. um raio de sol penetrou-lhe a branca camada dérmica e fez-se a paz. os tolos hão de ser recompensados por sua ignorância e ela era tola como todos aqueles à sua volta. todos filhos de deus, todos buscando um minuto de sabedoria, todos lutando contra o poder do anel do mal.

agora juliana vaga pelas montanhas, respirando o ar salubre e imaculado dos paradisíacos recônditos do planeta terra. e com seus sapatinhos vermelho-cintilantes e sua varinha de condão, suspira com a voz aliviada: "there is no place like home".


divagações sobre a dignidade (2)

a morte do meu alter ego sem honra:

"aqui jaz juliana gontijo, uma mulher tola como poucas."

não tardaria para que o silêncio eterno a convocasse para seus domínios. veio a óbito numa ensolarada tarde de domingo após praguejar estranhas maldições contra peixes moribundos à beira da baía de guanabara.

josué, seu cão e único objeto de afeto, contemplou-a com seu olho sadio nesse momento de ruína moral e com desdém caminhou tropegamente com suas três pernas na direção de um indigente grosseiro, que não continha um único dente na boca murcha e padecia de elefantíase e tuberculose.

ao perceber que havia sido abandonada pelo único que tolerava seus ininterruptos atos ignominiosos, seu frágil corpo começou a apresentar sinais de adoecimento. assim, às margens de águas putrefatas e sem nenhum amor, juliana foi dessa para uma melhor com quadro de falência múltipla dos órgãos e muita mágoa.

em seus bolsos foram encontrados um pequeno kit de costura para principiantes, uma pulseira do senhor do bonfim e um osso de procedência desconhecida. e como tudo na vida tem limites, ela se despede no anonimato, com um amargo fim para sua existência sem dignidade.


divagações sobre a dignidade (1)

juliana gontijo foi banida do convívio social após a prática contínua de atos tolos e impensados. agora, tal qual plutão foi rebaixado a planeta-nanico, encontra-se em estado deplorável de decadência e humilhação.

a dignidade a abandonou há muito, mas ao menos conserva intactos todos os seus dentes. menos os sisos, que foram devidamente extraídos em uma sanguinária e excruciante cirurgia em outubro de 1999.

nenhum membro da família mantém contato, fora o tio manco e enjeitado que tem sido evitado desde que perdeu o campeonato estadual de cuspe à distância.

sua carreira de cabeleireira está arruinada e todos os famosos que freqüentavam seu salão a trocaram por uma biba menos talentosa, transformando o horário nobre da globo num festival de mullets e permanentes.

juliana procura sem sorte a salvação para sua alma desamparada, já que os amigos lhe fecharam as portas. a sarjeta tem sido sua única companheira. a sarjeta e também rafael, o ex-polegar viciado em drogas. juntos freqüentam o programa do gugu e vagam pelo submundo se alimentando de pentes, pilhas e outros objetos que encontram ao acaso.

freqüentou a igreja evangélica, mas foi expulsa depois de ter sido vista roubando dinheiro do bispo para comprar roupas de grife e tentar penetrar numa festa em são conrado onde faria a única refeição do dia, beberia até se aproximar do coma e perderia a compostura mais uma vez.

espero que juliana possa encontrar honradez novamente, porém, em sua vida nas ruas, ela apenas deseja que seus rins não sejam roubados pela kombi dos órgãos enquanto dorme ao lado de josué, o cachorro perneta e parcialmente cego com quem divide um colchão debaixo de um viaduto em madureira.


sobre meus medinns

sou uma criatura possuída por fobias um tanto inusitadas. desde que era uma diminuta versão de mim mesma, temia as partes mais escuras do oceano no atlas. sentia calafrios ao imaginar os seres abissais que habitavam aquelas águas escuras e profundas. todos descomunais, no melhor estilo pré-histórico, com muitos olhos e dentes pontiagudos e grotescos.

o medo de altura já me acompanhava antes mesmo que pudesse compreender o mapa-múndi. bastava uma brincadeira fanfarronesca de me jogar para o alto para que meus olhos tomassem proporções de melancias.

também tinha medo da raia da piscina, imaginando que aquela listra escura se transformaria num terrível monstro que me destruiria em poucos segundos. digamos que minhas aulas de natação eram um pouco tensas...

tubarão então nem se fala. Até hoje tenho pânico. pânico. o filme do spielberg conseguiu traumatizar para todo o sempre esta pessoa que vos fala. não consigo nem ao menos encarar imagens do tal peixe feroz. por esta razão não pratico viagens ao recife e nas minhas raras idas à praia permaneço na beirada do mar, na companhia de crianças e idosos.

tenho vertigem do google earth. quanto mais distante fica a imagem, mais eu tendo ao desfalecimento. não sei explicar. minha boca resseca, sinto um arrepio nos órgãos vitais que irradia até o couro cabeludo, minhas pernas perdem a força, meus olhos reviram e começo a me sentir uma mísera poeira cósmica vagando na imensidão.

recentemente passei a desenvolver uma fantasia que ainda não se concretizou num medo real. agora que o calor começou a me atormentar, penso que o ventilador de teto vai cair em mim durante a noite. já ponderei sobre empurrar a cama de forma a não ficar na mira do objeto assassino, mas minha parcela sã não me permite tomar uma atitude de princípios tão infundamentados.

acho digno me apresentar às avessas. acho mesmo. quem sobrevive às trevas alheias terá motivos para alegrias depois. após a tempestade, a bonança. após as fobias, a graciosidade. é o que penso. mas sou uma verdadeira tola e possuo todas as fobias supracitadas...


quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

o ínicio do fim

uma moça semi-ruiva e persistente me incentivou e cá estou eu, expondo meu terceiro mamilo ao deus dará. a culpa é sua, chama flamejante da demência. a culpa é toda sua. gosto da idéia de iniciar um blog responsabilizando outrem por não ter coragem de admitir que há tempos desejo ser proprietária de uma pocilga virtual dessas.

e já que estou aqui, começo cagando regras: tenho preferência por letras minúsculas. esse é um ponto importante para mim. não sei bem o porquê, mas é assim que acontece. todo mundo tem suas manias e eu poderia estar roubando, poderia estar matando ou ainda praticando pequenos delitos, mas só o que faço é abolir as letras maiúsculas de minha rotina. isso e também atentar contra a língua portuguesa eventualmente. não sou boa com as regras gramaticais, desta forma, sigo escrevendo na língua do terceiro mamilo, que segue normas bastante particulares.

então é isso. o flanco esquerdo do meu terceiro mamilo começa a coçar, indicando que teremos chuva de granizo na madrugada. até.